Entrevista com o Dr Carlos Vaz
8 de Março, 2021
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Entrevista com o Dr Carlos Vaz

“Alguns doentes têm receio, cancelam consultas e adiam intervenções cirúrgicas já programadas“

Devido ao contexto pandémico que vivemos, alguns doentes que sofrem de obesidade deixaram de comparecer nas consultas médicas devido ao medo. O Dr. Calos Vaz, coordenador da Unidade de Cirurgia Robótica da CUF, em entrevista à My Obesidade, explicou a importância de se aprofundarem os tratamentos desses doentes. Leia a entrevista completa.

My Obesidade (MO) | Quais estão a ser os principais impactos da COVID-19 nos doentes que são diagnosticados com obesidade?

Dr. Carlos Vaz (CV) | Alguns doentes têm receio e cancelam consultas e adiam intervenções cirúrgicas já programadas, assim atrasando tratamentos necessários, ou prejudicando o acompanhamento de doentes já em processo de tratamento, alguns no contexto de cirurgia bariátrica já realizada.
Além disto e temos em curso um estudo que o comprova, o desenvolvimento de perturbações de ansiedade e depressão no contexto da pandemia parecem traduzir-se num retrocesso na qualidade dos hábitos alimentares, com maior recurso a açucares e snacks ricos em gorduras.

MO | Que repercussão tem tido a nível de consultas e de cirurgias? É possível estimar o que, assim e ficou adiado?

CV | Apesar de tudo e uma vez que estamos numa unidade privada, a repercussão que sentimos, sendo alguma, não é significativa. Diria que tivemos uma redução de 5 a 10% do nosso volume habitual de consultas e cirurgias, sobretudo com adiamentos das mesmas, mais do que cancelamentos.
Mas admitimos que o panorama ao nível nacional, com quebras que estimamos acima dos 70 a 80% dos volumes habituais – isto sim, é alarmante e é isto que conta porque é aqui que encontramos a grande maioria dos doentes.

MO | Estes doentes têm deixado de aparecer nas consultas presenciais com medo do coronavírus. Em que medida a teleconsulta consegue ser uma boa opção para o seu tratamento?

CV | A teleconsulta é, e tem sido, uma excelente alternativa para acompanhar estes doentes – sobretudo aqueles que já estão em processo de seguimento após cirurgia bariátrica.

MO | Na sua opinião, é necessário um alerta urgente para que estes doentes continuem a comparecer tanto nas consultas, como nos procedimentos cirúrgicos?

CV | Sim. E por duas razões:

  • Já existem normas e procedimentos de segurança internacionais para que as consultas e, sobretudo, as cirurgia sejam realizados em condições de máxima segurança; a nossa unidade participou ativamente na definição destas normas e procedimentos (doc1);
  • Já existem alguns estudos internacionais, com milhares de doentes envolvidos que demonstram que a cirurgia bariátrica em tempo de pandemia Covid foi tão segura quanto no período pré-pandemia; uma vez mais, participámos no maior destes estudos (doc2doc3).

MO | Que medidas devem ser adotadas para recuperar os atrasos?

CV | Na verdade, penso que aqui não conseguiremos fazer milagres. Em primeiro lugar, temos que informar os doentes de que as consultas e as operações são seguras, tanto quanto eram antes da pandemia. Temos que ser insistentes nesta informação. Em segundo lugar, temos que continuar a lutar por voltar à normalidade tão depressa quanto possível – para o que a rapidez da vacinação é crucial. Sem isto estaremos sempre perdidos. Ainda que os doentes perdessem o medo, durante um pico pandémico como o que estamos agora a ultrapassar nunca teremos recursos disponíveis, humanos e outros, para tratar estes doentes. Então temos que ser realistas e fazer todos tudo quanto estiver ao nosso alcance para ultrapassar a situação pandémica atual.

MO | Como conciliar essas medidas com a alocação de recursos à gestão dos doentes COVID-19?

CV | Precisamente, não é possível sem ultrapassar a situação pandémica atual. A vacinação, acredito, é o único caminho.

MO | Com os tratamentos adiados e com o tempo de confinamento, que é propício, por um lado, a menor exercício físico e, por outro, a excessos alimentares, poderemos assistir a um aumento do fenómeno da obesidade?

CV | Sim. Já está a acontecer e, como tal, este é um problema que não pode ser descurado pelos familiares, que devem garantir o acompanhamento necessário e incentivar bom hábitos alimentares e de exercício físico.

Fonte: MyObesidade